3 de outubro de 2009

Rio 2016

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Leandro Fortes:


O rio deve essa ao Lula

Lula poderia ter agido, como muitos de seus pares na política agiriam, com rancor e desprezo pelo Rio de Janeiro, seus políticos, sua mídia, todos alegremente colocados como caixa de ressonância dos piores e mais mesquinhos interesses oriundos de um claro ódio de classe, embora mal disfarçados de oposição política. Lula poderia ter destilado fel e ter feito corpo mole contra o Rio de Janeiro, em reação, demasiada humana, à vaia que recebeu – estranha vaia, puxada por uma tropa de canalhas, reverberada em efeito manada – na abertura dos jogos panamericanos, em 2007, talvez o maior e mais bem definido ato de incivilidade de uma cidade perdida em décadas de decadência. Vaiou-se Lula, aplaudiu-se César Maia, o que basta como termo de entendimento sobre os rumos da política que se faz e se admira na antiga capital da República. Fosse um homem público qualquer, Lula faria o que mais desejavam seus adversários: deixaria o Rio à própria sorte, esmagado por uma classe política claudicante e tristemente medíocre, presa a um passado de cidade maravilhosa que só existe, nos dias de hoje, nas novelas da TV Globo ambientadas nas oníricas ruas do Leblon.

Lula poderia ter agido burocraticamente a favor do Rio, cumprido um papel formal de chefe de Estado, falado a favor da candidatura do Rio apenas porque não lhe caberia falar mal. Deixado a cidade ao gosto de seus notórios representantes da Zona Sul, esses seres apavorados que avançam sinais vermelhos para fugir da rotina de assaltos e sobressaltos sociais para, na segurança das grades de prédios e condomínios, maldizer a existência do Bolsa Família e do MST, antros simbólicos de pretos e pobres culpados, em primeira e última análise, do estado de coisas que tanto os aflige. Lula poderia ter feito do rancor um ato político, e não seria novidade, para dar uma lição a uma cidade que o expôs e ao país a um vexame internacional pensado e executado com extrema crueldade por seus piores e mais despreparados opositores.

Mas Lula não fez nada disso.

No discurso anterior à escolha do Comitê Olímpico Internacional, já visivelmente emocionado, Lula fez o que se esperava de um estadista: fez do Rio o Brasil todo, o porto belo e seguro de todos os brasileiros, a alma da nacionalidade. Foi um ato de generosidade política inesquecível e uma lição de patriotismo real com o qual, finalmente, podemos nos perfilar sem a mácula do adesismo partidário ou do fervor imbecil das patriotadas. Lula, esse mesmo Lula que setores da imprensa brasileira insistem em classificar de títere do poder chavista em Honduras, outra vez passou por cima da guerrilha editorial e da inveja pura e simples de seus adversários. Falou, como em seus melhores momentos, direto aos corações, sem concessões de linguagem e estilo, franco e direto, como líder não só da nação, mas do continente, que hoje o saúda e, certamente, o aplaude de pé.

Em 2016, o cidadão Luiz Inácio da Silva terá 71 anos. Que os cariocas desse futuro tão próximo consigam ser generosos o bastante para também aplaudi-lo na abertura das Olimpíadas do Rio, da qual, só posso imaginar, ele será convidado especial.




Rodrigo Vianna:

O complexo de vira-lata segue fortíssimo em nosso país. Se bem que, agora, parece mais restrito a setores da classe média...

Falo das estranhas reações a esse acontecimento maravilhoso: a vitória do Rio como sede das Olimpíadas de 2016.

Estava eu fora do alcance da internet - gravando uma reportagem nas proximidades de Iguape, no litoral sul de São Paulo - quando o Rio foi anunciado vencedor. Comemorei, em mensagens enviadas por celular à minha mulher - que é carioca.

Quando cheguei a São Paulo, na noite desta sexta, também comemorei com meu filho Vicente, outro nascido no Rio de Janeiro.

Em qualquer lugar do planeta seria mesmo motivo para comemorar. Mas, no Brasil, aparecem nessas horas os corvos agourentos: e a a corrupção? e as favelas? e a violência?

Mas que diabos! Parece-me tão óbvio que Olimpíadas não são (nem nunca serão) o remédio para nossos problemas seculares, parece-me isso tão óbvio (repito!) que sinto até certa vergonha de precisar argumentar diante de certas coisas que comecei a ouvir e a ler, assim que botei os pés de novo em São Paulo, nesta histórica sexta-feira.

Aos poucos, fui-me lembrando das diferenças entre Rio e São Paulo. Paulistano que sou, posso dizer sem medo de errar: parte das pessoas que vivem aqui na minha terra não gosta muito do Brasil. A verdade é essa.

Era esse o tom dos comentários que ouvi no rádio do carro, a caminho de casa. O locutor ia lendo os e-mails dos ouvintes, que criticavam a escolha do Rio: eram comentários mal-humorados, ranhetas, complexados.

No futebol, o brasileiro superou esse complexo de vira-lata. Nelson Rodrigues foi quem cunhou a expressão. Foi ele também quem mostrou como Pelé, com sua pose de rei, indicava a seus colegas em campo: somos fortes, somos bons, falta só acreditar em nós mesmos.

Lá pelas décadas de 50/60, com Pelé, superamos o complexo. Mas só no futebol. A síndrome do vira-lata infeliz continuou a nos abater em outras áreas..

Os mais pobres, em anos recentes, parecem ter vencido o complexo. Até porque não têm muita escolha. São brasileiros até o último fio de cabelo. Para o bem e para o mal. Melhor brigar e trabalhar pra fazer dese país uma terra um pouco melhor.

A vitória e a reeleição de Lula - mais do que motivo - são a prova de que parte dos brasileiros, especialmente os de origem mais humilde, superou o complexo. É uma parcela de brasileiros que foi capaz de eleger um homem monoglota, sem estudo, e além de tudo sem um dedo (ah, como essa marca do trabalho braçal incomoda nossas elites) para liderar o país.

Em contrapartida, a escolha - por duas vezes - de um presidente com esse perfil parece ter acirrado ainda mais o complexo de vira-lataa, entre certos setores de nossa classe média. É uma parte dos brasileiros (e como são numerosos em São Paulo) que não gostam de ser brasileiros. Gostam de ser netos de italianos, bisnetos de alemães, trinetos de poloneses, tataranetos de espanhóis.

Eles se envergonham do Lula que discursa em "português" na cerimônia do comitê olímpico (ouvi um sujeito falando disso hoje na rua). Queriam que discursasse em javanês?

Eles se envergonham do Lula que chora. Preferiam, talvez, o tom afetado daquele outro presidente, que adorava fazer piadas sem graça, e preferia discursar em francês ou inglês (tremendo complexo de vira-lata) para agradar os gringos...

Com Lula, o Brasil deixou de se ver como colônia.

Os problemas do Brasil - com ou sem Olimpíadas - são enormes. Cabe a nós resolvê-los. Podemos tentar fazer as duas coisas ao mesmo tempo: cuidar de nossos problemas, e organizar as Olimpíadas. Isso parece uma obviedade sem tamanho!

Ou alguém acha - por exemplo - que um sujeito, só porque ainda está pagando as prestações da casa, não pode fazer uma bela festa de fim-de-ano para os vizinhos e os amigos?

A escolha do Rio é reconhecimento da grandeza do Brasil. Não deve nos fazer ufanistas. Mas a verdade é que merecemos comemorar. Sem dar bola para os corvos agourentos. Eles que curem seus complexos viajando para Miami nas férias. E deixem o Brasil trabalhar para fazer uma bela Olimpíada em 2016.

Parabéns ao Rio. Viva o Brasil.



Luiz Carlos Azenha

A elite está se roendo. A elite odeia o Brasil

Lula tem sorte. "Rabo", é o que eles dizem.

O pré-sal foi rabo. A Copa foi rabo. As Olimpíadas? Rabo.

O Brasil? Um horror. É corrupto. Imagine só o que "eles" vão fazer com as verbas das Olimpíadas. Imaginem o que "eles" vão fazer com o dinheiro de nossos impostos.

Cá entre nós, quem é que gosta de esporte?

Quem é que vai se espremer em um estádio sem poder dizer no dia seguinte que teve algum tipo de privilégio?

Privilégio.

Essa é a palavra que define a elite brasileira.

O camarote da Brahma. O lounge exclusivo do aeroporto. A sala VIP.

A separação entre Casa Grande e Senzala é a matriz da brasilidade.

Para os amigos, tudo. Para os inimigos, toda a força da lei.

A cela especial dos diplomados. Os habeas corpus do banqueiro. Os negros que enriquecem e se tornam brancos.

Lula embaralhou bastante as cartas. É um sucesso de público.

Daí o estratagema da elite. Lula sim, o PT não. Lula sim, o Itamaraty é um horror -- dominado por chavistas. Lula é um democrata, Morales um demagogo.

É uma forma de negar o protagonismo histórico de Lula e, portanto, da classe na qual ele se originou.

É uma forma de dizer que Lula é inocente, tão vítima quanto todos nós de seus assessores "esquerdistas".

É a forma antropofágica de nossa elite de engolir Lula, ao mesmo tempo negando tudo o que ele de fato representa.

Por isso, o "rabo" de Lula. A sorte de Lula.

Lembrem-se, o pré-sal não foi resultado da sabedoria da Petrobras.

A Copa do Mundo não foi mérito do Brasil.

As Olimpíadas não foram mérito do Rio de Janeiro.

Não, foi tudo "sorte" do Lula.

Foi um acaso. Foi "rabo".

O BrasIl? É um horror. "Eles" são corruptos. "Eles" elegem gente corrupta. "Eles" não sabem gastar nosso dinheiro.

O Brasil são "eles", aqueles que não tem acesso ao nosso camarote, à nossa Casa Grande, à nossa sala VIP.

Se eles fossem como a gente, seríamos Paris. Ou Nova York.

Infelizmente, somos Brasil.

PS: É por isso que, hoje, quando o Rio ganhou, celebrei com os colegas de "firma". Depois, fomos todos trabalhar.



Paulo Henrique Amorim

O Brasil devia isso ao Rio

Lula empenhou seu cacife político na campanha do Rio 2016.

Se o Rio perdesse, o PiG (*) e a elite branca, especialmente a de São Paulo, que é separatista, cairiam em cima de Lula, como se fosse um coitadinho, um operário metalúrgico que tentou ir além dos sapatos.

Lula, logo após a vitória de 66 a 32, ressaltou que o Brasil devia isso ao Rio.

Ao Rio, que já foi capital da República, que foi politicamente esvaziado, e passou a freqüentar as paginas podres do PiG (*), o Brasil devia ao Rio – disse Lula.

(Nessa hora, Lula olho no olho do repórter da Globo …)

Ninguém mais do que o Presidente Lula trabalhou para re-fazer esse mapa geopolítico.

A distorção começou com Juscelino, que tirou a capital do Rio e abriu o ciclo da inflação.

Tirou a capital do Rio para isolar a capital do povo.

Levou a indústria só para São Paulo – e botou o resto do Brasil para trabalhar para São Paulo.

Depois, o regime militar esvaziou o Rio, porque o Rio era brizolista.

E a Globo, por causa do Brizola, estigmatizou o Rio e transformou o Rio numa Medelín.

Acabou hoje a minoridade política do Rio.

Como disse o Presidente Lula, em lágrimas, esse é o atestado de cidadania do Brasil.

É a prova de que o mundo reconhece que o Brasil chegou lá.

E que o Rio é o Rio.

Capital do Brasil !


Eduardo Guimarães:

Durante coletiva de imprensa concedida em Copenhague pela delegação brasileira defensora da candidatura do Rio como sede dos jogos olímpicos de 2016, o enviado do Correio Brasiliense perguntou ao presidente Lula, na forma de insinuação, algo como se ele não temia ser vaiado na abertura das Olimpíadas no Rio como foi durante a dos jogos Panamericanos em 2007, no Maracanã. Lula, paciente, respondeu que então, em 2016, não seria mais presidente, e que, naquele momento, estaria mais preocupado com as olimpíadas de inverno, ou coisa que o valha. Contudo, coube ao governador do Rio, Sérgio Cabral, dar a resposta que o teleguiado repórter merecia. Reproduzo abaixo, de memória, a resposta do governador:

Quem armou aquelas vaias perdeu as eleições seguintes e está sem mandato, e o presidente Lula é um dos políticos mais bem avaliados do mundo, meu caro. Tem oitenta por cento de popularidade, é amado pelo povo brasileiro